sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

A Cena



Me jogaram no deserto de areias finas
e fiz castelos de areia
enquanto minha mãe não chegava.

Criei um mundo de areia
com direito a tudo o que queria.

Quando a maré do ano novo chegou
me trouxe a salvação,
me matou a fome e a sede,
me tomou o circo e trouxe o pão.

A lua sem razão acendeu seu abajur
e me fez dormir por longos anos.

Quando acordei a selva me recebeu
de braços abertos e mãos fechadas.

Logo, quem dorme não sente fome,
mas prolonga a espera da sede.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

A carência


Desregula meus objetivos (você).
Sem noção de onde seguir
qualquer força me impele.
Esvazio a razão,
estou cheio de nada.
Tenho desejos
mas se dissipam,
mera luz refratada
no prisma
que depois retorna
e atinge o que tem na frente.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A águia e o mar



Mar,
Se eu te encontrasse de novo,
Me estenderia às suas margens
Alegre
Pelo intenso otimismo do astro rei,
O sol.

Se as tuas águas atingissem os meus pés
Eu então viajaria
Para um lugar que contivesse
O enigma do céu noturno
E a transparência do dia
Unidos em lua de mel.

Ah, se eu te encontrasse
E tudo fosse igual,
Como nos tempos de outrora!
Quando minh’alma não estava condenada
À prisão perpétua
Na cela
Do amadurecimento.

Ah, que belos eram aqueles
Claros dias!
Em que o meu raro sorriso reluzia.
Que bela essa lembrança
Contida na poesia
E que ninguém consegue apagar.

As garças e gaivotas
Pelo azul ávido
Onde essas e outras
Aves
Abrem
Suas asas.

Asas, eu lembro!
De quando por sobre uma águia
Eu criança naveguei
Pelas águas
Condensadas no céu
Em forma de nuvens.



Ah, ela me mostrou!
Grandes reinos,
Homens e palácios,
Que eu quando fosse homem
Veria
Cair.

Me mostrou os milharais
Que crescem indiferentes
A tudo o que acontece.
Eu vi pessoas que me viam,
Percepções
Insignificantes.

Eu só vi alguns grandes,
Que habitavam a terra.
Eram pequenos homens
Que se faziam grandes
Por receberem o título temporário
De crianças.

Eles foram os únicos
Que me acenaram.
Mas sei que logo se esquecerão,
Assim como eu que tenho breve lembrança
De quando eu era criança
E com essa águia viajava.

Quando meu suspiro eterno eu der
Quero pensar no pacto
Que fiz
Com a águia do mar
E a águia que eu sabia
Logo ia chegar.



 



domingo, 12 de dezembro de 2010

Mosaico
















A ordem está fora de ordem.
E eu fico tentando juntar os pedaços do mosaico.
Estou construindo um quadro novo.

Quando todos os membros estão inertes,
quando todos os sentidos estão entorpecidos,
quando toda a cidade parece estar vazia
então me encontro com o som das ondas
mesmo que bem longe da fonte.
A fonte são os olhos e a água jorra na forma de vapor
quente e atual.
Queima feito pão de padaria

sábado, 20 de novembro de 2010

A estrada


Não sei se do banco de trás sou mero espectador
ou se escrevo essas linhas agora.
Só sei que rezo pelo caminho errado.
Não sei se estou certo
quero chegar em casa e descansar meu sono.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Contos da cidade



Na vitrine vi meu desejo estampado.
A etiqueta e o cartaz diziam que o preço era in-dizível
para mim.
O preço me apressa a ganhar o valor que nunca terei
ao menos que a vidraça se despedace feito muro de Berlim
e eu não tivesse que pagar com fome
a minha sede
de posse.



quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Anti-Poema


Saudade da areia quando estava em minhas mãos.
As palavras que eu repreendia eram raras e escuto com gosto.
As coisas sem importância são raras.
Fútil é quem não diz futilidades,
a vida não se veste de terno e gravata.
A vida xinga e berra. Transborda.

Os grandes livros foram escritos com sangue,
sorvê-los não é pecado algum,
Pelo contrário
faz jus a sua razão de ser.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Na pele do tigre



Na pele do tigre sendo caçado
cercado dos predadores que não existiam,
na pele do pedreiro demolindo a construção.
Na pele da oração de pedido de misericórdia.
Na pele do saber que é certo
mesmo quando contra seus princípios.
Na pele do cego atravessando a rua sozinho
mesmo escutando ruídos em sua direção.
Na pele do poeta que perdeu a palavra
e escreve o inverso de seu verso.
Na pele da escuridão diurna,
da novidade dos dias.
Na pele do surdo que entende tudo
e dá risada das pessoas que não se entendem muito bem.
Melhor é entender-se consigo mesmo.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Céu Aberto






Sky is high above  me
And a bird I see flying high

And I know this is the path

I was before.


Por que a chuva caiu e levou
O que já estava há tempos.
Mas é o mesmo céu por outros olhos.
Do mesmo homem
Mas com cicatrizes adicionais
E que nunca olha adiante.
Que gosta do vento sobre a face,
de diferentes lugares...
Mas enfrenta a poeira do tempo.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Abstenção



As lembranças já não são mera visão.
São tão fortes quanto imagem real e me carregam quando bem entendem e não posso dizer nada
por que posso chamar a atenção delas ao meu esconderijo.
Não sou mais o poeta que brinca de esconde-esconde com a vida. A vida me prega peças do quebra-cabeças que fiz. E não sou mais capaz de dizer-me receptor de poesia. Meus escritos são fragmentos de minha vida. E não quero escrever sobre mim.
Então me abstenho.